26 setembro, 2008

Ensaio Sobre a Cegueira (Blindness)



Filmar um livro de José Saramago, por si só, já é uma idéia que chame a atenção. Quem já leu o renomado português sabe que não é nada fácil acompanhar as muitas vezes intrincadas linhas e complicados diálogos, sem falar nos temas e nas abordagens. Isso poderia afastar muitos dos possíveis espectadores, mais interessados em diversão fácil do que em um filme com a densidade de um livro de Saramago. Felizmente, uma boa dose de publicidade bem feita - sem falar nos comentários, positivos e negativos, nos vários festivais em que esteve - tratou de colocar a produção em destaque.

Os direitos do livro estavam vendidos há tempos, para o produtor e o roteirista do filme. Saramago fez a única exiência de que não se conseguisse identificar a cidade nem o país em que a história se passa. Fernando Meirelles, nosso conterrâneo diretor, locou o filme em cidades diferentes para conseguir o efeito - embora seja verdade que ele puxou levemente para São Paulo em algumas tomadas.

O elenco tem quase que só grandes nomes. Mark Ruffalo e Juliane Moore, como o casal principal, Danny Glover, Gael Garcia Bernal, e a brasileira Alice Braga - que aparentemente vai no mesmo caminho de Rodrigo Santoro conquistando seu lugar no cenário internacional - estão nos papéis centrais. Não há muitas surpresas, e essa é a maior deficiência da fita. Meirelles, que soube tirar atuações primorosas de não-atores em Cidade de Deus, não conseguiu trabalhar bem os profissionais aqui. Não há ninguém ruim, mas todos poderiam estar melhores.

Ensaio Sobre a Cegueira é um dos mais contundentes livros do português, daqueles feitos para nos fazer pensar, e muito. O filme tenta chegar ao mesmo nível, mas é muio difícil, especialmente em se tratando de Saramago. Ele consegue ser bastante forte em alguns casos, mas também passa muito levemente em algumas questões. Isso torna o filme não tão pesado quanto poderia - e, assim, mas palatável. Ainda assim, divide opiniões. Sem trocadilhos, é ver pra crer.

19 setembro, 2008

Mamma Mia! - O Filme (Mamma Mia!)




Os musicais vieram para ficar. Já é quase certo: se uma produção saiu-se bem na Broadway, virá fatalmente para a telona. E felizmente, a transição tem sido muito bem feita, e temos vários bons musicais por aí. Mamma Mia! vale-se de utilizar somente músicas do Abba. A história é tola - como o são quase todas as músicas do grupo. Em compensação, é também muito divertida - como o são quase todas as músicas dos suecos.

A diretora novata Phyllipa Lloyd - novata no cinema, pois tem uma boa carreira no teatro e na ópera - soube aproveitar bem outra das grandes vantagens do filme: a locação. As Ilhas Gregas são belíssimamente mostradas, com todo o seu charme peculiar, e utilizando também a ótima luz natural que o verão grego proporciona. Como ela mesma dirigiu a versão Broadway do musical, temos aqui uma versão que deve ser muito próxima, em clima, do que está nos palcos.

O elenco combina alguns diamantes com boas novidades. Meryl Streep não precisa de apresentações nem de críticas. É uma atriz no estágio em que qualquer coisa que se dê a ela será bem feita, e aqui não é diferente. Ela é acompanhada por Julie Walters e Christine Baranski, duas também veteranas, embora de menor peso, que se divertem bastante em seus papéis. No lado masculino estão Stellan Skarsgård, Pierce Brosnan e Colin Firth, todos excelentes atores, bastante confortáveis em seus papéis. É bem verdade que, em uma música ou outra, fica claro que alguns deles são melhores atores que cantores, mas nada que tire a graça. A jovem Amanda Seyfried completa o elenco principal, com uma atuação bastante boa, o suficiente para não fazer feio frente a tantos grandes nomes.

Ainda há, infelizmente, muito preconceito contra os musicais no cinema. Fruto de algumas bobagens cometidas nas décadas passadas, e do fato também de que muitos não conseguem enxergar que o gênero pode, e deve, fazer parte do composto cinematográfico. Para quem ainda não aprendeu a apreciar um bom musical, o filme pode parecer chato. Para quem gosta, é pura diversão.

14 setembro, 2008

Os Desafinados




O aniversário da Bossa Nova - por mais estranho que seja comemorar a idade de um gênero musical - mexeu com a produção cultural brasileira. Foi feito de tudo um pouco: shows, documentários, livros, compilações, a Bossa estava em todo o lugar. E no cinema também. Utilizando o já batido expediente de pegar um fato real e construir uma história fictícia ao redor, Os Desafinados, de Walter Lima Jr., faz a sua pequena história da Bossa Nova, falando de um grupo que não foi ao famoso show do gênero nos Estados Unidos.

Walter Lima Jr. é um diretor de filmes muito diferentes. Do bobinho Ele, O Boto ao intimista A Ostra e o Vento, este Os Desafinados pode ser o mais maduro da sua produção. Não há muita profundidade, mas há uma maneira de filmar coerente com a proposta, uma boa escolha de elenco, a utilização inteligente da fotografia para marcar a ambientação, e uma história bem fechada, que responde só o necessário.

Nos papeis principais, bons jovens atores brasileiros, a começar por Rodrigo Santoro, o agora mais internacional dos brasucas. Ele sabe construir um personagem como poucos, e é justamente o seu Joaquim que marca melhor a passagem do tempo na história - não por acaso, o personagem mais principal do grupo. Ângelo Paes Leme também faz um bom papel, que poderia ser melhor aproveitado, e temos também a surpresa do não-ator Jair Oliveira - o eterno Jairzinho - que se não está totalmente à vontade no papel, mostra bastante esforço. Outro colega músico, André Moraes, sai-se um pouco melhor. Cláudia Abreu também atua bem, como Alessandra Negrini - ambas já são do tipo que sabem o que fazem em qualquer papel. Selton Mello, provavelmente o melhor do grupo, deixa os colegas brilharem fazendo muito bem o seu papel coadjuvante.

Os Desafinados é um filme divertido e leve, que tem um pouco de tudo: vai do humor ao drama mais ou menos denso com bastante fluidez. A trilha sonora, que poderia e deveria ter maior participação, é pouco aproveitada, uma pena. Mas nada que tire a graça da fita. Não é a história da Bossa Nova, é uma delas. Mas bem contada.