28 setembro, 2011

Trabalhar Cansa

Existe uma vertente nacional que responde pelo nome popular de “novíssimo cinema nacional”. São cineastas jovens, muitos estreantes, e em comum a busca de romper alguns conceitos, e de unir outros. São experimentações como essas - por que já passaram boa parte da Europa e nossos hermanos argentinos - que fazem o cinema de um país ganhar uma personalidade. Infelizmente, é muito difícil que esses filmes cheguem ao circuito comercial - afinal, o lucro também move a produção cinematográfica. Mas é gratificante ver que estamos no rumo certo no momento certo. Enquanto produções nacionais já disputam salas e receitas com os blockbusters estrangeiros, as novas cabeças aproveitam a onda para obter os recursos necessários para existir.

Trabalhar Cansa é a estreia de Marco Dutra e Juliana Rojas em longas, e mistura os aparentemente opostos assuntos do drama familiar com suspense. A construção narrativa é bem mais convencional do que outros filmes do movimento, e mesmo que os curtas da dupla, mas nem por isso menos interessante. Há uma habilidosa transformação entre os gêneros no decorrer da fita, que a todo momento quase se sobrepoem.

De um lado, a nova empreendedora Helena, interpretada por Helena Albergaria, precisa fazer seu novo mercadinho de bairro funcionar, enquanto encontra sua personalidade como chefe e convive com mistérios no seu local de trabalho. Do outro, o marido Otávio, papel de Marat Descartes, vive o pesadelo da classe média ao perder o emprego de uma década e ver-se obrigado à busca infrutífera por um novo. Ambos são rostos desconhecidos que se saem muito bem em suas performances, evitando as caricaturas que seriam mais simples para os dois personagens e dando-lhes contornos mais profundos.

Muito pouco é explicado, e a própria construção dos personagens não obedece os formatos usuais de nenhum dos estilos usados. A brincadeira de passar de drama para suspense pode causar algum estranhamento, mas tem um efeito interessante: presta-se muita atenção. Exibido em Cannes na mostra Un Certain Regard, Trabalhar Cansa é um exemplo do que o cinema brasileiro pode abraçar muito em breve.

21 setembro, 2011

Larry Crowne (Larry Crowne)

Chegar ao topo da carreira, para um ator de Hollywood, significa ser capaz de geri-la sem muita interferência. Para alguns o caminho é fundar a própria produtora e continuar fazendo mais do mesmo, apenas ganhando duas vezes sobre o próprio trabalho. Para Tom Hanks, o sucesso representou a possibilidade de investir de fato no cinema. Ele começou, claro, produzindo, mas logo passou para o roteiro e a direção, estreando bem com The Wonders. Ele também ficou atento a novos talentos, e conseguiu pescar, de uma apresentação de stand-up comedy, a hoje conhecida Nia Vardalos - Hanks ajudou-a a transfornar o monólogo no divertidíssimo Casamento Grego.

E é com Nia Vardalos que ele divide o texto de sua última produção, Larry Crowne. Vardalos, depois daquele primeiro filme, não conseguiu o mesmo sucesso - na verdade, cada nova produção sua era um tanto pior que a anterior, ao ponto do quase constrangimento. Em parceria com Hanks o roteiro melhorou, mas ainda não despontou. Ele mesmo assina a direção, em um filme que parece feito para cumprir tabela.

A história, com o interessante mote da desconstrução do sonho americano como o não tão interessante trampolim para o, sempre ele, amor, tem poucas camadas. Com o próprio Tom Hanks no papel principal, atuando apenas o mínimo para ser convincente, Larry Crowne perde o emprego e é obrigado a rever tudo sobre sua vida - incluindo a perda do símbolo máximo do american dream, a casa no subúrbio. Sua parceira romântica é bem feita por Julia Roberts, numa atuação melhor que a de seu diretor. A participação especial do ex Star Trek George Takei no papel do professor de economia é excelente. E Wilmer Valderrama, rosto conhecido do seriado That 70’s Show, mostra potencial. Mas a melhor coisa do filme provavelmente é Gugu Mbatha-Raw, inglesa descendente de africanos que em seu primeiro papel em longas mostra uma ótima performance, fazendo frente ao regular Hanks com facilidade. Chego a pensar se, assim como com Vardalos, Hanks não estaria apostando na atriz novata com esse filme.

Apesar de simpático e tocante, falta algum vigor. Mesmo sem pretensão, o filme consegue avançar com bom ritmo - as mudanças físicas no personagem Crowne, promovidas pela colega de faculdade interpretada por Mbahta-Raw, quase sustentam esse ritmo. Aliás, é na relação entre Crowne e Talia - e não entre ele e a professora de Julia Roberts - que está praticamente toda a graça do filme, o que por si só diz muito em uma produção com a alcunha de comédia romântica. Há momentos engraçados, mas não há grandes risadas, assim como também não há muito romance. Um exercício de manutenção para Hanks, apenas um pouco de diversão para o público.

07 setembro, 2011

Os Smurfs (The Smurfs)


Se você viveu em pelo menos um pedaço dos anos 80, você certamente assistiu a pelo menos um episódio dos Smurfs. Se já nasceu nos anos 90 ou depois, ainda assim provavelmente conhece as criaturinhas azuis e sua música repetitiva. Os personagens nasceram em 1958 como personagens de quadrinhos, e ganharam fama na TV durante a década perdida - o último episódio inédito foi ao ar em 1989. Há muito fala-se em um retorno dos Smurfs, e finalmente os boatos viraram realidade. Confesso que fiquei um tanto receoso quando soube que fariam um longa metragem - não é simples transformar episódios de 20 minutos em um filme de 120. E ainda mais quando soube que haveria interação com atores reais, em Nova York.

Saber que a produção contratou Raja Gosnel para a direção tampouco ajudou a melhorar a situação. Seu currículo conta com bobagens como Esqueceram de Mim 3, Vovó Zona e os dois fracos filmes do Scooby Doo. Tudo revelava uma combinação de ingredientes pouco promissora. Só as imagens da modelagem por computador dos seres com três maçãs de altura dava algum alívio.

Mas, no fim das contas, a mistura deu certo. Além da computação gráfica excelente, a história conseguiu unir o charme dos episódios curtos às necessidades de um longa. E, vejam só, esse charme veio justamente do fato dos Smurfs acabarem em Nova York. O início, mostrando a Vila dos Smurfs na Floresta Encantada, gera suspiros de nostalgia nos adultos, e de expectativa nas crianças. Elas são, aliás, o grande público do filme - ao contrário de outros com a mesma origem que tentam agradar os trintões como se eles fossem pequenos. É por isso que Smurfs funcionou no cinema: usou o foco certo e fez um filme infantil simpático e agradável.

Claro, não foge dos clichês do gênero ao colocar o tom moralizante, na figura de um homem preparando-se para ser pai. Neil Patrick Harris, conhecido de diversas séries televisivas, faz seu papel sem exageros. Jayma Mays, seu par, já perde levemente a mão e não resiste à fofura azul. Hank Azaria, a quem coube o vilão Gargamel, estudou bem o personagem animado e atua com desenvoltura, inclusive na sua interface com o gato virtual Cruel - também excelentemente modelado e animado. Feito para crianças como deve ser, divertido e descompromissado.

06 setembro, 2011

Planeta dos Macacos: A Origem (Rise of the Planet of the Apes)




Planeta dos Macacos é parte do cabedal cultural de boa parte do ocidente. Mesmo que seja fácil encontrar alguém que, hoje, não assistiu ao filme original ou a alguma das continuações da década de 70, é difícil que algo da história não seja familiar. Pode ser a icônica cena final do primeiro, com a Estátua da Liberdade destruída, pode ser simplesmente a imagem de macacos falantes dominando o mundo, ou alguma das muitas frases que ultrapassaram as décadas. E, como toda herança cultural, há sempre muito barulho quando se mexe nela. O filme de Tim Burton de 2001, tecnicamente falando, não é ruim, pelo contrário. Mas a história foi muito mudada para que pudesse ser aceita - para quem não lembra, ou não viu, no original o astronauta cai num planeta dominado por macacos que descobre-se depois ser a terra no futuro; na versão de Burton, trata-se também do futuro, mas em um outro planeta, que para piorar, no final, revela-se extremamente parecido com a Terra, mas construída pelos macacos.

A nova tentativa de relembrar a história não busca mudá-la ou refazê-la, mas sim explicar suas origens. No original, a evolução dos macacos é atribuída à guerra nuclear - sempre ela nos filmes da época da guerra fria. Agora, um tratamento genético experimental faz um chimpanzé desenvolver inteligência superior à de um ser humano. Novamente, muitos não vão gostar tanto assim da explicação, e vão torcer o nariz. E, novamente, é um bom filme, tecnicamente falando. A produção é excelente, os efeitos especiais são soberbos, e os pequenos detalhes de roteiro feitos para os fãs ardorosos da trama original estão ali - cita-se a primeira viagem tripulada à marte, e o subsequente desaparecimento dos astronautas, sem falar nos nomes e alguns diálogos.

A grande sacada desta versão é a utilização da captura de movimentos e expressões. Andy Serkis, sempre ele, dá vida à Cesar, o chimpanzé super inteligente, com realismo. Ele chega a sutilezas como “evoluir” a forma de se movimentar, parecida com a de um primata comum, mas levemente aprimoradas. A atuação virtualizada de Serkis supera de longe a de James Franco como o cientista que cria a terapia genética. Felizmente, há a presença do veterano John Lithgow enobrecendo as cenas em que participa. Freida Pinto, conquistando Hollywood, não surpreende. Brian Cox aparece pouco mas convence bem, e Tom Felton, em seu primeiro papel pós Harry Potter, faz um personagem muito parecido com o seu Draco Malfoy - é ele que diz a fala mais conhecida do filme original, “Tire suas mão fedidas de mim seu maldito macaco sujo!”

A explicação, em si, é boa, por colocar Cesar em uma posição em que não restava muito a fazer senão tentar se impor sobre os pobre humanos intelectualmente inferiores. Falta alguma emoção em certas partes, e foi um certo exagero colocar o orangotango conversando com sinais com Cesar - dá a impressão de que ele, também, é extremamente inteligente antes de receber o remédio. Colocados lado a lado, deixando a emoção de fora, a versão de Burton ganha. Mas, por não contrapor tanto a história, esta vai agradar mais.

05 setembro, 2011

Amor a Toda Prova (Crazy Stupid Love)


É bastante possível que um número considerável dos filmes que chegam ao Brasil sejam comédias românticas. Estatisticamente, a maioria é só água com açúcar puro. Um outro bom número é bem fraco, e são bem poucos os que mostram realmente algum potencial, e menos ainda os que merecem a etiqueta de um filme muito bom. Amor a toda prova - uma tradução desnecessária de Crazy Stupid Love - está na faixa dos que mostram potencial.

Dirigido por Glenn Ficarra e John Requa, dupla que antes já havia comandado junto o bom O Golpista do Ano - aquele em que o Rodrigo Santoro faz uma ponta como namorado gay do Jim Carrey - e escrito por Dan Fogelman, que tem várias animações no currículo, incluindo os dois Carros, Bolt e recentemente o muito bom Enrolados. O filme não é todo bom, mas há algumas cenas e diálogos excelentes.

O elenco foi todo muito bem escolhido, começando por Steve Carell no papel principal do, como sempre, cara bonzinho, papel que o ator faz quase de cor. Sua parceira Julianne Moore, talvez por não ter se deixado acostumar com um personagem, ganha de Carell em todas as cenas. Mas ambos perdem para Ryan Gosling, sempre um bom ator em um papel competente - aqui, um conquistador cafajeste moderno. Apenas Emma Stone tem uma atuação fraca, exagerada e destoando do grupo. O elenco “infantil”, com Jonah Bobo e Analeigh Tripton, sai-se muito bem também - entre aspas porque Tripton, apesar de interpretar uma adolescente, já tem 23 anos.

As qualidades que fazem de uma comédia romântica grandiosa são raras. Infelizmente, são abundantes as que a fazem ser bem ruim. Amor a toda prova não chega a alcançar a grandiosidade, mas foge com charme das características ruins. Poderia explorar melhor alguns dos ótimos momentos, mas pelo menos os têm. Vale pela diversão descompromissada.