01 julho, 2007

Cão Sem Dono



Alguns dos maiores talentos do cinema brasileiro ainda estão relegados aos festivais e ao circuito alternativo. Esse parece ser exatamente o caso de Beto Brant, um dos melhores diretores da "nova geração". Brant alcançou certa fama com seu filme mais "palatável", O Invasor, onde, além de outras conquistas, revelou o excelente ator que o músico Paulo Miklos, dos Titãs, pode ser - esqueçam sua participação na novela da Globo. Uma breve análise da carreira de Brant revela o que parece ser um padrão: dirigiu alguns curtas nos anos 80 e começo dos anos 90, seu primeiro longa veio em 1997, Os Matadores, premiado em diversos festivais e visto por pouca gente, ficou um pouco mais popular com seu segundo longa, Ação Entre Amigos, idem nos prêmios, e tornou-se realmente conhecido por parte do grande público com O Invasor. Depois, voltou-se para o alternativo novamente com Crime Delicado, e agora, com Cão Sem Dono, pisa novamente de vez no cinema para poucos.

O filme mostra, em uma atmosfera intimista, a vida de um tradutor de russo desempregado, que vive em uma vida vazia em um apartamento vazio, acompanhado por um cachorro sem nome que o seguiu da rua até em casa, e esporadicamente por uma modelo iniciante. Somos, no filme, intrusos na vida de Ciro, e por isso estamos sempre um tanto incomodados com a nossa "presença". Brant mostra, com muita habilidade, como mesmo com relações e posses tão poucas, uma pessoa pode perder tudo. Marcela, a modelo que visita Ciro, descobre que tem câncer e afasta-se para um tratamento. Essa ruptura mostra que, mesmo com pouco, as pessoas podem perder tudo.

O elenco, com tão poucos atores quantos são os objetos no apartamento de Ciro, sai-se muito bem, dando ao filme aquele tom de "vida real" que praticamente todo filme alternativo tem. Não há nomes famosos, nem atuações particularmente excelentes. Tecnicamente, o filme segue quase à risca o lema "idéia na cabeça e câmera na mão" tão seguido pelos cineastas brasileiros.

Cão Sem Dono é um filme que agradará muito poucos - percebe-se isso facilmente na saída do cinema. Entretanto, é um exercício de estilo, e é assim que deve ser julgado. Como um livro que poucas pessoas conseguem terminar, um filme alternativo tem o seu papel na construção da arte em que se encontra. Uma produção em que o sentido está muito escondido entre os vazios da trama e da vida do personagem principal não se presta ao grande público, mas ajuda na formação de um diretor em que ainda devemos prestar muita atenção.

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