31 janeiro, 2009

Gomorra (Gomorra)



Apresentado com grande repercussão em todos os festivais em que passou, Gomorra foi chamado, aqui no Brasil, de “Cidade de Deus italiano”. A estética do filme, de fato, lembra um pouco, em alguns momentos. Mas as semelhanças terminam por aí. Baseado em um livro bombástico do jornalista Roberto Saviano, que pesquisou a fundo – tão fundo que trabalhou, de fato, para as máfias sicilianas, e por isso mesmo não pode pisar mais na Itália e vive agora exilado e protegido – a brincadeira que forma o nome do filme já é uma bela introdução do que vamos encontrar. Está ali um retrato dos tentáculos de uma das maiores organizações criminosas do mundo.

Mas não espere ver chefões engravatados desfilando em carrões, nem qualquer tipo de glamour. Estamos aqui no “proletariado” da máfia, no trabalho sujo feito sem luvas. E, por isso mesmo, muito mais real. Não há rostos famosos, e nem mesmo o diretor, Matteo Garrone, é muito conhecido, nem pelos mais ferrenhos cinéfilos. Gomorra é um pouco difícil de seguir. São cinco histórias, levemente intercruzadas, que mostram uma pequena pincelada das várias atividades em que a máfia se insere. Com uma fotografia realista, cheia de sombras que as produções comerciais se esforçam em evitar, e com personagens que não se inserem na dualidade maniqueísta mocinho/bandido – todos ali estão de alguma forma ligados ao crime, mas nem por isso são todos maus – não é para todos os gostos.

E, pelo jeito, não é para o gosto de Hollywood, que ignorou a produção que amealhou prêmios por onde passou, inclusive o Grande Prêmio de Cannes em 2008. Aqui, não vai sair do circuito alternativo, e nem deve. Bom pela brutalidade com que retrata uma denúncia minuciosa, não se adéqua ao espírito de entretenimento das salas comerciais.

25 janeiro, 2009

Austrália (Australia)




Em 2003, o diretor australiano Baz Luhrmann iniciou um projeto de levar às telas a história de Alexandre, o Grande. Diz-se que já estava escalado o elenco principal, formado por Leonardo DiCaprio e Nicole Kidman, nos papéis de Alexandre e Olympia, sua mãe. A produção foi interrompida porque outro grande diretor, Oliver Stone, estava também filmando o personagem. Muitos se perguntaram - e ainda se perguntam - como seria a visão de Luhrmann para uma produção épica e histórica como seria aquela. Dono de um estilo que usa e abusa de cores fortes, e que adora cenários fantasiosos, num primeiro olhar não seria um filme que nos faria pensar nele.

Mas a vontade de conduzir um épico ficou, e agora Luhrmann nos traz Austrália, um grandioso conto em meio a história da colonização australiana. Com bem mais cenas externas e bem menos cores do que estamos acostumados a ver nos seus filmes - o cenário árido do país é muito bem utilizado, inclusive com um contraste levemente incrementado que esquenta ainda mais a fotografia - ele consegue se sair bem nesta primeira experimentação, apesar de alguns pequenos deslizes no roteiro, que quase se perde em alguns pontos.

Nicole Kidman foi a primeira a aceitar estrelar a fita - segundo rumores, mesmo antes de ler o roteiro, só por ter o nome de Luhrmann na direção. E, segundo dizem, ela convenceu Hugh Jackman a aceitar o convite que já tinha recusado. Não podemos dizer que é o melhor papel para nenhum dos dois, apesar de Jackman estar à vontade no papel de machão. Nicole exagera um pouco nos trejeitos aristocráticos no começo, mas acerta mais depois. Em compensação, eles são acompanhados pelo ótimo garoto Brandon Walters, num papel não muito fácil para uma criança em sua primeira experiência na telona, e por um bom elenco de apoio.

Em alguns momentos, temos a impressão de que o filme já vai acabar - que são os pequenos deslizes no roteiro. De forma geral, poderíamos reduzir os 165 minutos da produção às 2 horas habituais sem grandes perdas. Mas, vá lá, estamos falando de Baz Luhrmann, o diretor que com apenas três outros filmes no currículo conseguiu um lugar de honra na lista de muitos cinéfilos - inclusive este. Pode ser que não fosse o momento mais adequado para um filme desse calibre, mas ainda assim é uma produção excelente, e que deve ser vista.

24 janeiro, 2009

Um Homem Bom (Good)




Vicente Amorim não é um dos mais conhecidos diretores brasileiros de cinema. Na verdade, é quase desconhecido. O único filme que alguns talvez se lembrem de sua seara é O Caminho das Nuvens, de 2003, que não teve muita projeção. Ainda assim, Amorim foi aventurar-se lá fora, e foi selecionado para comandar a produção Um Homem Bom, uma história que acontece no começo no nazismo na Alemanha.

A trama é muito interessante, e bastante inteligente em mostrar um drama pessoal envolvido pelos fatos que todos já conhecemos bem. O roteiro transita habilmente nos acontecimentos da vida do professor de literatura que se vê praticamente tragado pelo Partido Nacional Socialista, e tem que lidar com o melhor amigo judeu. Mas o tempo todo parece que falta algo.

Não é no elenco. Viggo Mortensen, conhecido por muitos pelo papel de Aragorn em Senhos dos Anéis, mostra que pode fazer outros bons papéis, como em Marcas da Violência e Senhores do Crime. Seu professor Halder é tão confuso e evasivo quanto o papel requer. Jason Isaacs, o amigo judeu, também é um rosto conhecido, mas talvez um pouco menos óbvio - ele faz Lucius Malfoy na franquia Harry Potter. É um ator que merecia mais atenção. A jovem Jodie Whittaker praticamente caiu de para-quedas no filme, substituindo de última hora a excelente Romola Garai, que desistiu pouco antes das filmagens começarem.

Com um roteiro interessante e um bom elenco, só faltou mesmo um diretor um pouco melhor. Não que Amorim não seja bom, mas há tanto que poderia ser feito com a combinação que ele teve nas mãos, tão mais que ele poderia extrair, que é difícil não admitir que tudo que falta ao filme vem dele. Um filme bom poderia ser ótimo. Mas ainda assim, é uma produção que vale a pena ser vista.

20 janeiro, 2009

O Curioso Caso de Benjamin Button (The Curious Case of Benjamin Button)




A maioria dos grandes escritores deixou, além dos livros e citações, ótimos contos, que vez por outra são lembrados ou encontrados. F. Scott Fitzgerald, um dos principais autores de língua inglesa, tem vários contos excelentes, e O Curioso Caso de Benjamin Button é um deles. Uma fábula moderna sobre o processo e o caminho da vida, na história de um homem que nasce velho e vai ficando mais jovem com o tempo. É um mote extremamente valioso para qualquer história, e nas mãos certas torna-se uma primorosa peça de arte. Por enquanto estamos falando apenas do texto.

Filmar uma história grandiosa como essa exige cuidado. Um projeto antigo da produtora, que já teve nomes como Steven Spielberg, Ron Howard e Spike Jonze sugeridos para a direção, e John Travolta e Tom Cruise no papel principal. Acabou nas mães de David Fincher, responsável por Seven, Clube da Luta e, recentemente, Zodíaco. Fincher teve um grande parceiro na produção, o roteirista Eric Roth, que assinou algumas obras memoráveis como Forrest Gump, Munique e O Bom Pastor. Um bom começo. Fincher e Roth exploraram a trama de forma muito comovente, respeitando os aspectos históricos do tempo em que o filme transcorre, e conduzindo tudo com um cuidado incomum em Hollywood.

Para o papel principal, um nome que já trabalhou com Fincher duas vezes, mas que muitos não considerariam como o mais apropriado para o papel. Brad Pitt esteve em Seven e Clube da Luta, e é mais lembrado como galã que como ator. Mas é um engano não lhe dar atenção. Auxiliado pelas excelentes maquiagem e efeitos especiais, Pitt dá vida ao papel com muita serenidade e com a postura de um ator experiente. Acompanhado por Cate Blanchett, que está sempre bem, e por um muito bem selecionado elenco de apoio, todos os papéis parecem certos para os seus atores.

Fincher teve a chance de contar uma ótima história, e não a desperdiçou. Ele conseguiu traduzir, de forma leve e acessível, um tema que poderia resultar em um filme bastante complexo ou pesado – e com isso afastaria boa parte do público. Mereceu cada uma das 13 indicações ao Oscar. Altamente recomendado.

18 janeiro, 2009

Bolt - Supercão (Bolt)




Apesar da Disney ter comprado a Pixar, ela ainda produzirá seus próprios filmes de animação fora do estúdio de Nemo e Wall-E. Ao que tudo indica, a Pixar ficará mais focada com as animações mais artísticas e elaboradas, e a Disney lançará as produções comerciais. Não que, em um caso como no outro, signifique que haja menos rigor na produção. Nem que os esúdios não colaborem entre si. Bolt, por exemplo, teve produção executiva de John Lasseter, atual presidente da Pixar e diretor de Toy Story e Carros.

Bolt tem, inclusive, um roteiro interessante, com aquela pitada de níveis além dos superficiais para agradar alguns dos mais velhos. E, claro, muita ação e cenas engraçadas para o público principal, as crianças. O esmero técnico parece ser bem puxado da Pixar, inclusive, talvez por influência do próprio Lasseter, talvez porque, afinal, é a Disney. Os personagens são bem trabalhados - o hamster Rhino é impagável - e a história flui bem.

Feito na medida certa para um filme de férias, é uma animação que começa a mostrar que a tecnologia tende a dividir os filmes em mais adultos e mais infantis - este cabendo no segundo critério. Antes demorava-se cerca de quatro anos para terminar uma boa animação 3D, tempo bastante reduzido hoje. Mas mesmo assim alguns adultos podem gostar.

10 janeiro, 2009

Se Eu Fosse Você 2




Uma comédia cheia de clichês alcançou o patamar de um dos filmes brasileiros mais vistos no cinema em todos os tempos. Nada mais natural, então, que fazer uma continuação. Se Eu Fosse Você 2 segue a mesma estrutura básica que o primeiro - um evento desconhecido leva um casal a trocar de corpo, para que eles possam se entender melhor. Se houve alguma intenção de fazer algo muito diferente do original, não foi alcançada. Nenhum grande prejuízo, já que é uma comédia das mais despretensiosas.

Glória Pires e Tony Ramos estão de volta aos papéis, e também às performances. Glória Pires, intepretando o marido, é o melhor do filme. Ela absorve os trejeitos masculinos na medida certa, ao mesmo tempo em que não deixa escapar as particularidades do corpo feminino. Tony Ramos está novamente um pouco caricato demais na sua feminilidade, exagerando e fazendo uma mulher que não é a que existia antes da troca. Como o filme gira em torno deles, os coadjuvantes devem apenas, quase literalmene, segurar as suas pontas. E isso foi muito bem feito, na novata Isabelle Drummond ao veterano Chico Anysio - um ator disfarçado de comediante que deveria ser mais aproveitado.

É preciso dizer, a favor da produção, que o roteiro utiliza muito bem os referenciais do primeiro filme, algo raro em qualquer continuação. E, mesmo sendo um "mais do mesmo", o timing bom da maioria das cenas garante as risadas, e isso é tudo que se pretende. Provavelmente não vai atingir o sucesso do original, mas vai garantir bons números ao nosso cinema - e esse é talvez o principal benefício, mostrar aos brasileiros que nós sabemos fazer cinema.

09 janeiro, 2009

Sete Vidas (Seven Pounds)




Will Smith, poucos sabem, começou sua carreira em filmes mais dramáticos, como Seis Graus de Separação. E, apesar de ser mais conhecido pelos papéis de ação, sempre flertou com o, por assim dizer, cinema sério. Produções como Lendas da Vida e Ali fazem parte do currículo do ator. Mas foi com À Procura da Felicidade que realmente começamos a reparar na sua performance artística. Agora ele se une novamente ao diretor italiano Gabriele Muccino em mais um daqueles filmes feitos para chorar.

Sete Vidas é muito bem feito. Não usa nenhuma técnica inovadora, mas é excepcional em sua funcionalidade. A história é contada aos poucos, explicada passo a passo, muito bem amarrada por um ótimo roteiro. Apesar de não ser um filme difícil, pode ainda pegar os mais distraídos de surpresa no final. Há apenas um pequeno ponto em que parece que a trama começa a correr para um lado diferente do objetivo inicial, mas mesmo esse "deslize" mostra-se eficiente na evolução do filme.

Will Smith exagera um pouco na interpretação. Mesmo sabendo que seu personagem sofre, não podemos deixar de notar uma leve overdose, ali beirando a tristeza cômica. Uma pena, já que seu papel na parceria anterior com Muccino foi muito bom. Para sua sorte, ele está bem acompanhado. Rosario Dawson faz um excelente papel, e rouba a cena de Smith sempre que aparece na tela. Barry Pepper, apesar de fazer apenas rápidas aparições, também sai-se muito bem, como Woody Harrelson e Michael Ealy em suas pontas.

O que realmente segura em Sete Vidas é o roteiro, cativante e emocionante sem ser piegas - embora algumas vezes quase chegue lá. Com alguns detalhes a serem acertados, teríamos um filme primoroso. Mas os pequenos defeitos não desmerecem esta produção muito bem acabada.