26 outubro, 2011

Amizade Colorida (Friends With Benefits)

No ano passado tivemos o prazer de ver na telona uma obra como há muito não surgia. Cisne Negro é daqueles filmes obrigatórios, tamanha sua força. Estrelado por Natalie Portman, uma das cenas mais faladas - infelizmente, pois o filme é muito mais do que isso - é a de sexo com Mila Kunis. Pois parece que nenhuma das duas gostou da experiência, pois pouco depois ambas estrelariam produções com temas iguais. Portman atuou em Sexo Sem Compromisso, lançado no começo deste ano, em que cultiva uma “amizade especial” com Ashton Kutcher. Pois Mila Kunis, quase ao mesmo tempo, filmava praticamente a mesma história com Justin Timberlake.

Amizade Colorida foi dirigido por Will Gluck, que antes deste tinha dirigido comédias escolares tolas. O ritmo que ele imprimiu a este, no entanto, casou muito bem com o estilo do roteiro. Claro, não se enganem, é uma comédia romântica, com todos os clichês do gênero e com os mesmos pontos chave. Como sempre, a grande diferença nesses filmes está no meio, e é a grande diferença entre o filme de Gluck e o de Ivan Reitman, que comandou Sexo Sem Compromisso. Reitman, veterano com boas comédias no currículo, sabe pesar melhor a importância de cada etapa, algo que Gluck negligencia um pouco. Em Amizade Colorida, a parte da amizade tem que ser inferida, já que o diretor optou por mostrar de cara o início da conturbada relação - e com isso, mais cenas de sexo e nudez. Mas não se anime, o bumbum que se vê em uma das sequências provavelmente não é da Mila Kunis.

Mas ele teve uma vantagem sobre Reitman. Timberlake, por incrível que pareça, faz um bom papel, não ficando muito atrás da charmosa Kunis. Pode ser que o caso aqui seja de menor distância de talento - Portman dá um baile no sempre mediano Kutcher o filme todo - mas essa relação é essencial para a graça do filme. Outra vantagem de Gluck foi uma melhor composição de diálogos. Não apenas aproveitam bem os personagens, mas também fazem uma “sequência de risos” quase incessante exatamente no momento da construção da trama. Também aproveitam bem o elenco de apoio, com destake para Patricia Clarkson e Richard Jenkins em boa forma.

A comparação é inevitável, mas também desnecessária. Nenhum dos dois compete por um posto no raro rol das comédias românticas excelentes - e creio que nenhum dos dois pretendia. Então, confabular sobre qual é mais engraçado ou mais bem feito é inútil. Ambos são divertidos em boa medida, ótimos para aqueles momentos em que tudo o que se quer é fugir por alguns minutos para um lugar em que o mundo parece perfeito.

Remake, Versão, Reboot



O cinema sempre soube se reciclar. Personagens famosos aparecem às vezes em dezenas de filmes, e vez por outra somos surpreendidos ao saber que aquele filme que adoramos é uma versão, ou torcemos o nariz quando ouvimos que o próximo lançamento é um remake. Há pouco tempo as pessoas da minha geração ficaram chocadas ao saber que Karate Kid seria refilmado, dirigido por Will Smith e tendo seu filho como personagem principal, Jackie Chan como Sr. Miyagi, e ambientado na China. Por mais que vários críticos tenham dito que, no fim das contas, o filme é bom, não tive ainda coragem de assistir. Como provavelmente não terei de ver o remake de Footloose. E espero sinceramente que todos os boatos sobre OldBoy sejam mentira. Vez por outra também lemos que tal franquia sofrerá um reboot. E há histórias que tem múltiplas versões. Por mais que cada um signifique algo diferente, no entendimento geral quase sempre o que é filtrado é que o filme em questão é uma cópia. Vamos tentar aqui esclarecer um pouco esses sobrenomes.

24 outubro, 2011

De Títulos e Traduções

 


Normalmente, as pessoas que gostam muito de filmes gostam de assisti-los na sua versão original. Isso significa o formato da imagem e o som original, na língua em que foi filmado. Ao contrário do que muitos pensam, não é só para tirar onda de que sabe falar inglês. Eu gosto de assistir sempre na língua original, seja ela sueco, japonês, espanhol, russo, alemão, italiano - para ficar só nos países com maior número de boas produções cujos idiomas não entendo nada. Eu acho que o som é parte da obra cinematográfica, e que tanto o diretor quanto o ator trabalharam muito, repetindo e refazendo cenas, para que aquele diálogo tivesse uma nuance única, e isso em qualquer língua que seja. Mas entendo que há pessoas - muitas, aliás - que preferem filmes dublados, e o meu xará Thiago Borbolla fez um excelente post sobre isso, do qual concordo com quase tudo. O que não concordo é com a qualidade cada vez pior das traduções brasileiras - e aí entram não só as dublagens como também as legendas e os títulos.

Eu sei que o trabalho não é fácil. Sei que há certos aspectos culturais em alguns diálogos e títulos que são quase intraduzíveis. Mas há, também, muito erro que poderia ser evitado. Como eu sei que o nome de uma obra muitas vezes já dá o tom - afinal, não adianta, todos nós julgamos pela capa, ou, neste caso, pelo poster - e não confiando nos tradutores, costumo sempre procurar o nome original. Pois me deparei há algumas semanas com um exemplo de tradução de título que não apenas é ruim, como joga contra a obra.

O filme It’s Kind of a Funny Story conta o caso de um adolescente com pensamentos suicidas que decide se internar em um hospital psiquiátrico. É bem filmado, tem boas atuações, ótimos diálogos, e aquele ar de cinema alternativo que os cinéfilos adoram. Mas a distribuidora brasileira resolveu chamá-lo no Brasil de Se Enlouquecer, Não Se Apaixone. O título lembra muito outro filme famoso, certo? Pois a presença de Zack Galifianakis é a única justificativa para a aberração dessa tradução. Seja sincero: você se interessaria por um filme chamado Se Enlouquecer, Não Se Apaixone? Eu não. Mas ainda bem que eu procurei o nome original. Tive a oportunidade de assistir uma produção excelente, que não chegou às salas brasileiras, e graças à tradução ruim poderia ter passado despercebida por mim - como, tenho certeza, passou por muitos.

Este é um caso em que a tradução não é tão simples. Não ficaria muito mais atrativo se o nome brasileiro fosse É Uma História Um Tanto Engraçada. Mas há opções melhores que a escolhida, sem dúvida. Às vezes, é até melhor deixar o título pouco explicado. Vai que o filme tem uma continuação que brinca com o nome original, como Ocean’s Eleven e Meet The Parents. Onze Homens e Um Segredo até é um nome legal, mas Treze Homens e um Novo Segredo é forçar a barra. E o que dizer de Entrando Numa Fria Maior Ainda Com A Família? Triste.

E parece que há um prazer especial em ter que colocar algo em português. Quando o nome não precisa de tradução - por ser o nome de um lugar ou de uma pessoa - insistem em colocar um subtítulo, quase sempre ridículo. Pulp Fiction - Tempo de Violência, Erin Brocovich - Uma Mulher de Talento, Moulin Rouge - Amor em Vermelho e, o pior de todos, Taxi Driver - Motorista de Taxi. É, foi assim que o filme foi lançado no Brasil. Agora pense que você é um diretor que faz um filme de ação/suspense em que algo acontece mas você não conta nem no título, nem na sinopse, nem nos trailers, deixando toda a emoção para o momento do filme em si. Pois eis que chega uma distribuidora brasileira e estraga toda a sua estratégia ao colocar um infame subtítulo desnecessário: Cloverfield - Monstro. Pior que isso, só quando o título nacional é algo que o filme diz explicitamente que não é o que acontece, como Amnésia, péssimo nome brasileiro do excelente Memento.

Então, tradutores e distribuidoras, por favor, pensem bem antes de decidirem por um título nacional. Pensem na obra, no trabalho dos cineastas e, especialmente, no público que vocês podem atrair, ou não, com um título ruim.

23 outubro, 2011

Gigantes de Aço (Real Steel)

Desconhecia por completo a existência de Gigantes de Aço até ver um trailer poucas semanas atrás. A trama parece levemente interessante, a conhecida história do underdog, do azarão em quem ninguém acredita, feita com robôs. Depois, vejo que ele está insistentemente no topo das bilheterias da América do Norte. Calhou de nenhum dos outros filmes que me interessam estar passando no momento que tinha livre, e acabei entrando para uma grata surpresa.


Confesso que o nome de Shawn Levy me assusta. O diretor acumula comédias bobas - algumas no nível da vergonha alheia - e não parecia estar interessado em outro tipo de produção. Não sei se a iniciativa de dirigir um drama como este partiu dele ou se ele foi contratado, mas pouco importa. Ele tem aqui a sua chance de mudar o perfil, se quiser. A história, baseada em um conto da década de 50, e bem roteirizado por Joh  Gatins, tem mais elementos do que se esperava, e do que o trailer deixava aparecer.


Hugh Jackman foi uma escolha inteligente para o papel principal do ex-boxeador, atual treinador de robôs lutadores e pai ausente. Suas limitações artísticas encaixaram bem no personagem, dando mesmo uma credibilidade inesperada. A bela Evangeline Lilly, apesar de se esforçar e dar alguns sinais de boa interpretação, está no elenco simplesmente para embelezá-lo - o que, claro, ela faz muito bem. Mas, como tem sido comum no cinema norte-americano, é uma criança que rouba a cena sempre. Dakota Goyo - que apesar de compartilhar o nome com uma grande atriz mirim, é um menino - dá um baile em Jackman e preenche a tela com o talento que, aparentemente, Hollywood tem facilidade em encontrar nos pequenos. Acostumado às telas desde seus seis anos, já teve a honra de interpretar o Deus do Trovão Thor na recente adaptação, e aqui faz seu primeiro papel de destaque.

Gigantes de Aço é um drama ao mesmo tempo de superação e familiar, a história de um quase perdedor buscando seu lugar ao Sol, e de um homem aprendendo a ser pai. Bem ambientada em um futuro próximo crível - em que os robôs lutadores convivem com o cenário de prédios como os de hoje - o filme consegue focar no que é de fato interessante na trama, tomando o cuidado de não cair em muitos clichês. Como na própria história, pode ser um azarão que parte para conquistar algum destaque. Para os amantes da nova luta da moda, um ponto interessante: o motivo dos robôs boxeadores existirem é a conquista de público pelo MMA, e um bom resumo da história da luta, citando inclusive a família brasileira Gracie, foi bem inserido na trama.

09 outubro, 2011

Capitães da Areia



Lembro-me de ter lido - e descoberto - Jorge Amado na adolescência, com Capitães da Areia. Uma leitura deliciosa, nas passagens bem compostas, no tratamento cultural do cenário, na história rica. Confesso com alguma vergonha que não conheço a fundo a obra desse grande autor brasileiro, mas do pouco que li, Capitães sempre foi o meu preferido. Ainda é nítido pra mim o espanto de ver um livro tratar abertamente de assuntos que ainda eram controversos à época em que o descobri, e saber que a obra era ainda mais antiga, de 1937 para ser mais exato. Já havia ali uma visão que hoje ainda é rara.

Por isso recebi, como sempre, com um misto de ansiedade e apreensão a notícia de que seria adaptado para o cinema. Meu primeiro receio foi que caíssem na tentadora armadilha de atualizar a trama para os tempos atuais, mas maior ainda foi de que a profundidade da história fosse perdida em nome das bilheterias. Felizmente o comando da adaptação estava nas mãos de Cecília Amado, neta do escritor, que assina a produção, o roteiro e a direção. Ela, que já trabalhou como continuista em outra obra adaptada de seu avô, Tieta do Agreste, consegue passar para a grande tela um cenário com quase tanto sabor quando o livro - aplausos também para o co-diretor e responsável pela fotografia, Guy Gonçalves.

O elenco, a exemplo de outro grande filme nacional, Cidade de Deus, é composto em grande parte por não-atores mirins, muito bem recrutados e treinados. Toda a trupe de Pedro Bala é composta de rostos desconhecidos, mas que souberam transmitir como profissionais o misto de esperteza, maturidade e carência que forma a personalidade dos Capitães. Merecem destaque, além do próprio Pedro Bala feito por Jean Luiz Amorim, o Professor de Robério Lima, o Gato de Paulo Abade, e a Dalva de Ana Cecília. Mas o grande aplauso vai para a Dora de Ana Graciela, numa interpretação digna de prêmios.

A todos vocês que ainda viram o rosto e fazem caretas para o cinema nacional, Capitães da Areia é obrigatório, como foram o já citado Cidade de Deus e os dois Tropa de Elite. Além de ser cinema de primeira qualidade, é baseado em literatura brasileira de primeira qualidade. Claro, há concessões, e há faltas, mas o clima do livro, o charme, está todo lá. Espero que, além de levar multidões às salas, Capitães da Areia também desperte no nosso iletrado povo o desejo de conhecer mais esse grande autor.