16 junho, 2007

Não Por Acaso




O cinema brasileiro ainda sofre de um certo preconceito, adquirido pelas produções de qualidade discutível de alguns anos atrás, especialmente as que abusavam da nudez e dos palavrões, marca do nosso cinema entre as décadas de 70-80. Esse preconceito atinge especialmente a nós mesmos, brasileiros. Mas, ainda que muitos brasileiros ainda torçam o nariz para as nossas produções, a qualidade do nosso cinema subiu espantosamente. Temos, ainda, algumas marcas a vencer, especialmente a do cinema-social, insistente nos roteiros nacionais. Não Por Acaso é uma agradável surpresa nesse meio. Um filme brasileiro que se passa em uma grande cidade não nomeada - mas que todos sabemos ser São Paulo - e conta uma história sem apelações para nossos vários problemas.

O que mais marca essa película é que ela poderia, tranquilamente, ser uma procução européia, ou mesmo norte-americana independente. O roteiro, a fotografia, os movimentos de câmera, a semi-linearidade, tudo está arranjado de maneira a ser um filme de apelo universal. O mote de um mesmo acontecimento que influencia a vida de pessoas que não se conhecem não é nova, e por isso mesmo permite ao diretor e roteirista Philippe Barcinski - brasileiro, apesar do nome - trabalhar mais em estilo que em forma. O diretor é conhecido apenas dos cinéfilos frequentadores de festivais de cinema, que já o viram com seu excelentes curtas Palíndromo e Janela Aberta.

Além da linguagem bem utilizada, ele também se mostra um bom diretor de atores. O elenco ajuda, sim, com atuações bastante competentes de Rodrigo Santoro, Letícia Sabatella e dos também quase desconhecidos Leonardo Medeiros - mais frequente nos filmes "de festival" do que em produções mais populares - e Branca Messina. Barcinski consegue dar o peso certo a cada um, fazendo um filme que quase não tem personagens principais. É o acontecimento fatal que realmente presta o papel principal, e a belíssima cena que mostra a diferença entre dois segundos na vida daquelas pessoas é especialmente notável.

Preciso me corrigir agora. Quando disse "apelo universal", estou pensando mais nos amantes do bom cinema do que no público geral, mais interessado na superficialidade e nos efeitos especiais. Mas Não Por Acaso cumpre muito bem o seu papel de chamar um pouco mais a atenção dos que realmente gostam de cinema para o nosso mercado, e imagino que isso será especialmente verdade lá fora. Felizmente, é preciso também notar que ao mesmo tempo em que estamos formando bons cineastas, também estamos formando bons cinéfilos, a julgar pela crescente visitação aos festivais e ao fato de que este filme apareceu nas salas comerciais na mesma semana de alguns blockbusters.

Nenhum comentário: